Por que o motor 3 cilindros da Fiat tem apenas 6 válvulas?
Entenda o motivo da Fiat ter lançado dois novos motores, com apenas duas válvulas por cilindro
Por Jorge Augusto
A chegada do Uno 2017 foi marcada essencialmente pela oferta de novos moto res. São dois novos moto res bicombustíveis de 1.0 litro, de três cilindros, e 1.3 litro de quatro cilindros. Trata-se dos novos moto res desenvolvidos globalmente pela FCA – Fiat Chrysler Automobiles e que fazem sua estreia mundial a partir da unidade de powertrain de Betim, Minas Gerais.
Como destaques, ambos os moto res oferecem o maior torque de seus respectivos segmentos aliado a baixo consumo. No moto r 1.0 litro, são 10,9 kgfm a 3.250 rpm e, no 1.3 litro, 14,2 kgfm a 3.500 rpm. O bom torque é distribuído desde as baixas rotações, diferenciando-se da grande maioria dos rivais multiválvulas (quatro por cilindro).
Duas válvulas por cilindro
Mas a característica mais marcante desse novo projeto é a escolha da configuração de duas válvulas por cilindro. Observando atentamente os moto res concorrentes de três cilindros, vai se observar que todos são multiválvulas (quatro por cilindro). Nessa lista estão o 1.0 litro da Hyundai, o 1.0 litro da Volkswagen, o 1.2 litro da Peugeot Citroën e 1.0 litro da Ford.
Não é de hoje a discussão de qual solução que é melhor: 2 ou 4 válvulas por cilindro. Antigamente, era comum dizer que os moto res multiválvulas eram melhores para alto desempenho com maior potência, porém com perda de torque em baixa rotação. Já o moto r com duas válvulas por cilindro, era o exato inverso. Mas isso mudou com tecnologia, e a chegada dos comandos variáveis, além dos sistemas de injeção eletrônica e injeção direta.
Com a tecnologia foi possível diminuir bastante, as limitações de cada uma das configurações, ou seja, mais torque baixo no moto r multiválvulas, e mais potência no moto r com duas válvulas por cilindro. Ainda sim, cada uma das configurações, preservam suas melhores características de acordo com um determinando tipo de uso.
A primeira explicação para a maioria dos moto res pequenos trazerem a configuração multiválvulas é bem simples. Desde o início do projeto, esses moto res foram pensados para operar inicialmente com gasolina, e preverem também uma configuração turbo alimentada.
As características de detonação da gasolina, e a presença do turbo (que aumenta consideravelmente a vazão de ar no cabeçote) funcionam muito melhor com a configuração multiválvulas. Assim, ao serem adequados para o uso flex e aspiração natural, esses moto res mantém a característica inicial do projeto multiválvulas.
No caso da FCA, a escolha foi diferente. Desde o início, o moto r foi projetado para ser Flex e com aspiração natural. Não está previsto o uso do turbo, nessa família de moto res! Isso começa a explicar a adoção de duas válvulas por cilindro, uma solução mais indicada para as necessidades da nossa região, tipo de combustível e uso urbano do veículo.
Com duas válvulas por cilindro, os moto res têm a característica nativa do elevado torque em baixa rotação (que, na prática, é a resposta mais rápida do acelerador numa arrancada ou numa ultrapassagem). Além disso, o consumo também reduzido em cargas parciais (pouco acelerador) e rotações médias, situações mais frequentes dentro das cidades.
As soluções tecnológicas
Para otimizar o desempenho com duas válvulas, a FCA trabalhou muito no desenho das câmaras de combustão. As válvulas de admissão são responsáveis, em parte, pela aspiração da mistura ar-combustível para dentro dos cilindros, enquanto as válvulas de escape auxiliam a expulsão dos gases resultantes da combustão. Mas a quantidade de válvulas não é a única determinante para o fluxo dos gases. Outros fatores influenciam esta dinâmica, como o desenho e o formato dos dutos de admissão e escapamento e a configuração do comando de válvulas.
Nos moto res da FCA, as duas válvulas por cilindro, tem o desempenho geral equiparado ao da maioria dos moto res quatro válvulas, quando o assunto é potência máxima de cada um deles. No 1.0 de três cilindros são 77 cv, e no 1.3 chega a 109 cv com quatro cilindros. Esse é o maior valor já alcançado em um moto r 1.3 litro de aspiração natural fabricado no Brasil. Em termos de potência específica (82 cv/l), o 1.3 supera todos os concorrentes do mercado de 1.2 até 1.6 litro naturalmente aspirados.
Outra característica muito importante do projeto, é a adoção de uma única dimensão de pistão e cilindro, para ambos os moto res, 1.0 e 1.3. Esta construção modular permite que vários componentes sejam compartilhados entre as versões de três e quatro cilindros, racionalizando a produção e permitindo uma manutenção mais fácil.
Como se economiza energia
A potência e o torque gerados por um moto r são influenciados pelo consumo de energia demandada para seu próprio funcionamento. Nessa nova família de moto res, a adoção de duas válvulas por cilindro é um fator de economia. Ao contrário das unidades multiválvulas, os novos propulsores não precisam acionar um conjunto complexo de componentes, com quatro molas, quatro balancins e quatro válvulas a cada ciclo. Com um único eixo comando de válvulas, o torque necessário para mover este conjunto corresponde a um pouco mais da metade da força necessária nos concorrentes.
O conjunto valvetrain, que consome menos energia pelo simples fato de contar com menos elementos, ainda se beneficia de sistema de roller finger. Trata-se de rolamento exatamente na posição de maior atrito do conjunto, ou seja, no ponto de contato com o came (ressalto do eixo de comando). Esta solução reduz drasticamente a perda de energia e, com menos força para se movimentar internamente, mais potência e torque sobram às rodas do veículo. E isto também se converte em redução de consumo e menos emissões.
Nesta família de moto res, até mesmo a própria movimentação dos pistões e virabrequim foi otimizada. Usando um desenho mais eficiente do virabrequim, é obtido um menor atrito entre pistão e cilindro. Trata-se de um deslocamento de apenas 10 mm entre o eixo do virabrequim e o centro dos pistões. Este pequeno deslocamento reduz o atrito do conjunto, resultando em mais energia final.
A bomba de óleo (responsável pela lubrificação do moto r), também foi aprimorada. Com deslocamento variável, ela altera o fluxo de acordo com a necessidade do moto r, demandando menos potência mecânica, e reduzindo consumo.
Outra característica interessante é o valor da taxa de compressão. Quanto mais alto, maior o aproveitamento da combustão da mistura ar-combustível, o que resulta em mais potência e menor consumo. A taxa de compressão do novo moto r (13,2:1) é maior que a grande maioria dos moto res multiválvulas com injeção direta, em nível mundial. Isso beneficia claramente o uso do etanol, com um aproveitamento muito melhor desse combustível. Já no caso da gasolina, as tecnologias de comando variável, e sistemas modernos de ignição, previnem a pré-detonação do combustível.
São várias as características que otimizam consumo e desempenho:
1) Adequado enchimento dos cilindros (comparáveis aos melhores quatro válvulas do mercado)
2) Combustão completamente otimizada (comprovada pela alta taxa de compressão)
3) Consumo interno de energia baixíssimo (único comando de válvulas roletado e duas válvulas por cilindro)
4) Aplicação do CVCP (Continuously Variable Cam Phaser – variador contínuo do comando de válvulas), capaz de adotar o ciclo Atkinson de combustão em baixas cargas e com médios regimes de rotação.
Uma das limitações de eficiência do moto r de ciclo Otto é a perda de bombeamento de ar/combustível em carga parcial. Quando a velocidade do veículo está estabilizada e o condutor reduz a pressão do pedal do acelerador, a maioria dos moto res diminui a abertura da borboleta do acelerador, criando uma perda considerável pelo bombeamento dos pistões.
Neste momento, os novos moto res da FCA adotam uma variação no eixo do comando de válvulas (através do CVCP), atrasando a abertura das válvulas de escape e admissão, diminuindo as perdas por bombeamento, e aumentando significativamente a eficiência do moto r nesta condição de funcionamento. Isso garante uma redução de até 7% no consumo de combustível.
A fase fria, e suas melhorias
Outro fator importante na economia de combustível são as soluções adotadas para o funcionamento na etapa de aquecimento. Esta fase compreende a primeira partida do dia até que o propulsor alcance sua temperatura ideal de trabalho. Trata-se de um momento crítico para o consumo de combustível e emissão de poluentes.
A nova família traz soluções, que vão desde a partida a frio com pré-aquecimento (que dispensa o tanquinho de gasolina) até o uso de óleo de baixíssima viscosidade (0W20), que garante lubrificação as partes móveis desde a partida a frio.
O bloco do moto r e do cabeçote em alumínio, além da redução do peso, também esquenta mais rápido na fase fria, e realiza melhor a troca de calor (para o resfriamento) na fase quente.
Outros detalhes importantes
- Ambos os moto res, 1.0 e 1.3 litro, adotam uma única dimensão de pistão e cilindro, com 333 cm³ cada. Na versão com três cilindros, o deslocamento total é de 999 cm³, enquanto na com quatro cilindros são 1.332 cm³.
- Smart Charger, ou alternador inteligente. Otimiza a recarga da bateria nos instantes em que a energia cinética do veículo seria desperdiçada, como nas desacelerações e reduzidas de velocidade.
- Filtro de óleo reposicionado na parte de baixo do propulsor, bem na frente do veículo. Posicionado em lugar de fácil acesso, reduzindo o tempo de troca, e protegido entre o cárter de aço estampado e o suporte do compressor do ar-condicionado, integrado ao sub-bloco.
- Sistema HCSS (do inglês, Heated Cold Start System), que elimina a necessidade de tanque auxiliar de gasolina para partida a frio. O HCSS garante partidas com etanol puro, mesmo em temperaturas abaixo de zero grau Celsius.
- Corrente do comando de válvulas que dispensa manutenção e tem durabilidade acima dos 200 mil quilômetros. Conta também com a tecnologia “silent chain” que oferece funcionamento mais suave e silencioso.
- A vareta de óleo integrada à tampa que passa por dentro do moto r, evita vazamentos de óleo e facilita a manutenção.
Revista Comprecar
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